Minas Gerais e o país se veem, recentemente, em estado de alerta com relação à febre maculosa, tendo em vista o crescente número de casos e óbitos confirmados da doença. Somente no estado, segundo dados da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG), duas mortes por febre maculosa foram confirmadas neste ano e, entre janeiro e junho, nove casos da doença foram registrados, sendo as regiões Central, Vale do Aço, Leste e Sul as que apresentam maior frequência dos mesmos.
A Fundação Ezequiel Dias (Funed), que é o Laboratório de Referência Nacional para Febre Maculosa e outras Riquetsioses, também tem registrado um aumento considerável no número de amostras recebidas com suspeita de febre maculosa. Somente neste mês (entre 1º e 19/6), 160 amostras deram entrada na Funed com suspeita de febre maculosa. Dessas, 80% são do estado de Minas Gerais e outras 20% dos estados de Ceará, Distrito federal, Goiás, Pernambuco Rio de Janeiro e Tocantins. Esse aumento se deve, em grande parte, pela maior sensibilidade dos profissionais de saúde quanto aos sintomas e histórico de locais por onde o paciente esteve.
Segundo a responsável pelo Laboratório de Riquetsioses e Hantavirose da Funed, Ana Íris Duré, hoje a Fundação é referência por ter condição de dar suporte ao diagnóstico de laboratórios centrais de saúde pública em 19 estados do Brasil. Nos laboratórios do Lacen-MG da Funed, são realizadas a sorologia de humanos e outros animais vertebrados, a biologia molecular das mesmas amostras e também dos carrapatos que são encaminhados para a instituição, além da capacitação de profissionais de outros estados, para a realização dos mesmos serviços. “Um dos critérios de sermos referência nacional é por produzirmos o insumo para diagnóstico da febre maculosa em nosso laboratório. O Brasil, como um todo, apresenta muita dificuldade para aquisição desses insumos, e nós os fornecemos aos demais laboratórios públicos, por termos profissionais treinados para tal atividade, além de um laboratório de nível de biossegurança 3, adequado para trabalhar com a bactéria da febre maculosa”, comenta Ana Íris.
A doença
A febre maculosa é transmitida por um carrapato infectado do gênero Amblyomma sp., conhecido popularmente como carrapato-estrela, que pode se hospedar em capivaras e em outros mamíferos. A doença pode demorar até duas semanas para se manifestar após o contato inicial. Conforme o Ministério da Saúde, os principais sintomas da doença são febre, dor de cabeça intensa, náuseas e vômitos, diarreia e dor abdominal, dor muscular constante, inchaço e vermelhidão nas palmas das mãos e sola dos pés, gangrena nos dedos e orelhas, e paralisia dos membros, que inicia nas pernas e vai subindo até os pulmões, causando parada respiratória.
Mesmo podendo ocorrer durante todo o ano, é no período de clima seco que a febre maculosa se intensifica. Isso porque a chegada do inverno registra a queda nas temperaturas e a redução das chuvas, condições ideais para o ciclo reprodutivo dos carrapatos, que podem transmitir a doença tanto no seu estágio de larva, ninfa ou na fase adulta. “O fato de muitas pessoas não se lembrarem que tiveram contato com os carrapatos, ou não perceberem a presença dos mesmos no corpo, pode fazer com que a notificação do paciente apareça com a suspeita de outros agravos que tenham sintomas semelhantes”, explica a responsável pelo Laboratório de Riquetsioses.
Ana Íris informa ainda que a Funed, no entanto, tem como diferencial trabalhar com protocolo de doenças hemorrágicas. Nesses casos, as amostras biológicas das solicitações que se enquadram no critério são aliquotadas e encaminhadas para os laboratórios que investigam esses agravos dentro da Fundação, de forma que as análises complementares são realizadas ao mesmo tempo, e cheguem a um diagnóstico mais rapidamente. “Por ser uma doença de notificação compulsória, toda vez que temos um resultado positivo para febre maculosa, as autoridades estaduais e o Ministério da Saúde são acionados, para que sejam tomadas as medidas protetoras, como por exemplo indo aos locais de transmissão para que não aconteçam novos casos”, ressalta.
Referência Nacional
Desde novembro de 2020, a Funed é reconhecida pelo Ministério da Saúde como o Laboratório de Referência Nacional para Febre Maculosa e outras Riquetsioses. Na prática, a Fundação é a responsável por dar suporte às análises realizadas em todo o país, orientar acerca da vigilância epidemiológica, capacitar profissionais para implantar esses diagnósticos, além de preparar e treinar profissionais do estado de Minas Gerais para a vigilância ambiental. Há mais de uma década, a Funed, como Laboratório Central de Saúde Pública (Lacen-MG), atua como referência regional na Rede Laboratorial de Febre Maculosa e outras Riquetsioses.
Para se tornar Referência Nacional, a Funed teve que cumprir alguns critérios para habilitação estabelecidos pela Rede, como ser instituição pública; atender aos requisitos de Gestão da Qualidade – conforme o escopo do laboratório e tendo como referência as normas vigentes da ABNT, tais como NBR ISO IEC 17025 ou NBR NM ISO 15189, ou outras que venham a substituí-la; atender aos requisitos de Boas Práticas de Biossegurança, conforme legislação e outras normas vigentes; comprovar disponibilidade de metodologias adequadas ao diagnóstico do agravo, em consonância com a evolução científica e tecnológica; além de possuir equipe técnica com formação profissional e experiência compatível com a área de conhecimento para a qual pretende se habilitar.
Capacitações
O Laboratório de Entomologia, do Serviço de Doenças Parasitárias, em parceria com o Laboratório de Riquetsioses e Hantavirose da Funed e com a SES-MG, ministra o Curso Prático para Profissionais na Atuação de Vigilância Epidemiológica em Ambientes de Ocorrência da Febre Maculosa (FM) e outras Riquetsioses para Unidades Regionais de Saúde do Estado. Em 2022, o treinamento foi feito em dez Regionais, contemplando 88 municípios. No primeiro semestre deste ano, nove municípios da Regional de Saúde de Pouso Alegre já foram treinados e, na última semana, os municípios da Regional de São João Del Rei receberam a capacitação.
O curso conta com uma parte teórica, ministrada pela referência técnica do Laboratório de Riquetsioses e Hantavirose, Ana Íris Duré, e pela referência técnica do Laboratório de Entomologia, Ana Lúcia Pedroso. Nessa parte, é abordado o ciclo da doença, o modo de transmissão, sinais e sintomas, o diagnóstico laboratorial, biossegurança, o acondicionamento e o transporte correto das amostras para o Laboratório Central de Saúde Pública de Minas Gerais (Lacen-MG). A parte prática, realizada em campo, envolve a coleta de vetores no solo e em hospedeiros domésticos.
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