No Dia da Consciência Negra, ganha força o debate sobre como a hipersexualização do corpo feminino negro segue influenciando, de forma profunda, a saúde sexual e reprodutiva das mulheres negras no Brasil. Pesquisas do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA em parceria com o UNFPA apontam que elas enfrentam mais barreiras para acessar cuidados especializados — desigualdade que não se explica por fatores biológicos, mas por um legado histórico de desumanização.
Esses estereótipos, originados no período escravocrata e perpetuados em diferentes esferas sociais, ainda moldam a forma como o corpo negro é percebido nos serviços de saúde: mais resistente, mais disponível e menos sensível. Essa visão distorcida contribui para a negligência de sintomas, para o atraso de diagnósticos e para o agravamento de condições que afetam diretamente o bem-estar físico e emocional.
A fisioterapeuta pélvica Flaviana Teixeira destaca que o impacto desses imaginários é profundo.
“O problema não está na mulher negra, mas no que foi culturalmente projetado sobre ela,” afirma. “Quando o corpo é visto como mais forte ou mais disponível, muitas mulheres sentem que não têm ‘direito’ à dor, ao cuidado ou à vulnerabilidade. Isso repercute no autocuidado, na autoestima e na forma como sintomas são percebidos ou expressos.”
Segundo a especialista, quadros como dor pélvica, tensão muscular, desconfortos íntimos e dificuldades no pós-parto são frequentemente minimizados — tanto por profissionais de saúde quanto pelas próprias pacientes, influenciadas por esses estigmas. O resultado é o agravamento das condições e o aumento do sofrimento físico e emocional.
Para Flaviana, discutir saúde íntima no âmbito da Consciência Negra é fundamental para romper com esses padrões e promover ambientes de cuidado mais acolhedores.
“Cuidar da saúde íntima também é reconstruir a relação com o próprio corpo,” afirma. “Conforto, bem-estar e prazer não podem estar submetidos a expectativas sociais que colocam a mulher negra como sempre disponível ou sempre resiliente. Espaços de cuidado precisam reconhecer essas histórias e considerar a dimensão emocional da experiência feminina.”
O debate reforça que enfrentar o racismo na saúde é parte essencial da luta por igualdade e dignidade, especialmente para mulheres historicamente silenciadas por estereótipos que ainda persistem no imaginário social.
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