O Brasil registrou 62.517 mortes violentas intencionais em 2016. Pela primeira vez o índice superou o patamar de 30 homicídios a cada 100 mil habitantes, segundo a última edição do Atlas da Violência.
O indicador é 30 vezes superior à taxa de assassinatos registrada na Europa. É como se estivéssemos em uma guerra civil sem que uma guerra fosse oficialmente declarada.
Segundo o Datafolha, as principais preocupações do brasileiro hoje são a saúde e a violência.
Em setembro, 23% dos brasileiros apontavam a saúde como principal problema do país; 20% acreditavam ser a violência. Pouco antes, em junho, os índices eram de 18% para saúde e 9% para violência (menos da metade, portanto).
As eleições eram (ainda são) uma grande oportunidade para discutir o assunto com a seriedade que ele merece. A ideia era que saíssemos da campanha mais seguros do que entramos, mas o que temos observado é exatamente o oposto: saímos da campanha em pé de guerra.
Não bastassem os índices reais e robustos do mundo real, a discussão está sendo sequestrada pela criação de fantasmas e paranoias difundidos no mundo virtual.
Nesse terreno, a sua família, que com razão está assustada, não está sendo assombrada pela troca de tiros, o tráfico ou a guerra ao tráfico na vizinhança, mas sim por materiais didáticos que supostamente estimulam a sexualidade precoce das crianças e jamais foram distribuídos nas escolas.
Em uma eleição marcada por poucas propostas e muita gritaria em busca de culpados “por tudo isso que está aí”, hábitos simples como andar nas ruas de mãos dadas ou usar adesivos deste ou daquele candidato viraram risco de vida. Na busca delirante por segurança, muitos se sentem seguros para agredir quem julga marchar com o inimigo. Basta, para isso, carregar qualquer símbolo que o provoque, seja uma bandeira de arco-íris, seja uma hashtag contra seu candidato.
Os relatos pipocam por onde se joga luz e se você não está apavorado e/ou paranoico, ou você não vive neste país ou está off-line.
Segundo a coluna Painel, da Folha de S.Paulo, o clima beligerante é tanto que as Forças Armadas já manifestarem preocupações com atos de violência que possam ser praticados por grupos radicais após a eleição.
O medo do recrudescimento da força bruta no futuro governo é tão martelado pelas promessas de caça a opositores e elogios a torturadores que tem candidato acusando o vice do adversário de cometer crimes em uma época em que o acusado era apenas adolescente. Responder ao medo com mais medo dá nisso: um tilt na própria lógica e coerência.
O medo sequestrou o debate eleitoral, e ele impede, inclusive, de observar atentamente as particularidades de cada região: onde recuamos, onde avançamos, o que fazer, o que deixar de fazer para vivermos, afinal, em um país com índices aceitáveis de segurança.
Um exemplo é o Rio de Janeiro, onde escândalos de corrução e confrontos entre gangues e facções produzem cenas apavorantes para o resto do mundo. Lá um candidato a governador linha-dura desponta como favorito para se eleger no próximo domingo. Seria resultado de um estado de deterioração nunca antes apurado? Não exatamente.
Não faz muito tempo, o estado registrava, em 2012, a menor taxa de homicídio de sua série histórica apurada pelo Instituto de Segurança Pública.
Há seis anos o índice era de 28,7 assassinatos por 100 mil habitantes. Hoje a taxa é de 40, um número alto, mas ainda menor do que era em 1991 (60,3) ou em 2002 (54,7).
Já São Paulo, maior estado do país, tem a menor taxa de homicídios por 100 mil habitantes: 10,9, segundo o Atlas da Violência 2018. O estado também teve a maior redução da taxa de 2006 a 2016: uma queda de 46,7% nos assassinatos. Ainda assim a promessa do candidato a governador líder nas pesquisas é dar carta branca para a polícia matar.
A violência é complexa e não se resume apenas a assassinatos. Envolve taxas de roubo, furto, sequestro, entre outros crimes.
Falar de segurança, por fim, é falar de sensação de insegurança. Uma sensação que pode ser vivenciada ou estimulada. Com mais acesso a informação, temos mais acesso também a notícias que antes não conseguíamos visualizar e agora pipocam em nosso celular e na propaganda.
FONTE : YAHOO NOTÍCIAS