Em uma audiência pública que durou quase sete horas, realizada na segunda-feira (27/03), a Comissão Extraordinária de Acompanhamento do Acordo de Mariana ouviu diversos atingidos pelo rompimento da Barragem de Fundão, da mineradora Samarco. A reunião foi realizada na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Os atingidos por barragens reclamaram da demora no pagamento de indenizações e cobraram participação nas negociações do novo acordo de reparação de danos. Essa pactuação está sendo mediada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com representantes da Samarco e suas controladoras (Vale e BHP Billiton), dos governos federal e dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo e dos Ministérios Públicos federal e dos dois estados afetados.
A produtora rural Maria Célia Albino de Andrade, de Conselheiro Pena (Vale do Rio Doce), relatou os prejuízos em sua propriedade, que foi atingida pela lama de rejeitos de minério da Samarco. Segundo ela, a produção de leite de sua fazenda caiu de 52 para 12 litros por vaca a cada dia. A produção de capim, milho e goiaba ficou impraticável com a terra tomada pela lama. “Hoje temos só lama e desgraça. É só destruição”, contou.
Maria Célia de Andrade disse ter recebido uma indenização da Fundação Renova, criada pela Samarco para gerenciar as ações de reparação de danos, mas reclamou dos valores propostos aos produtores rurais. Segundo ela, os atingidos não têm participado da repactuação em curso.
Também produtor rural, Marino D’Angelo Júnior representa os atingidos do distrito de Paracatu de Cima, em Mariana (Região Central do Estado), e reclamou do retrocesso econômico da região após o rompimento da Barragem de Fundão. Segundo ele, em algumas fazendas, a camada de lama de rejeitos chega a seis metros de altura. “As pessoas não conseguem mais plantar”, afirmou.
Para Marino, a repactuação, da forma como vem sendo conduzida, não vai resolver os problemas da população prejudicada pela Samarco. “Todo mundo traz uma solução sentado em uma cadeira com ar condicionado, mas ninguém foi lá ver o tamanho do buraco”, criticou.
Já a liderança indígena Meire Mniamá Purí, de Aimorés (Vale do Rio Doce), relatou que seu povo não foi reconhecido como atingido pela Fundação Renova. Segundo ela, a poluição do Rio Doce pela lama de rejeitos da Samarco comprometeu o modo de vida tradicional dos indígenas. “O rio, para nós, é sagrado. Ele nos fornece o de comer e o de beber. A Samarco tirou tudo o que era nosso e não quer fazer uma reparação”, afirmou.
CNJ garante participação popular
O conselheiro do CNJ Luiz Fernando Bandeira de Mello disse que o órgão tem feito um enorme esforço para garantir a participação popular no processo de repactuação do acordo de Mariana. Ele argumentou que as negociações contam com a participação do Ministério Público e da Defensoria Pública, que defendem os interesses das pessoas atingidas pela lama da Samarco.
Ele negou que os atingidos não tenham sido ouvidos no processo de negociação. Segundo o conselheiro, o novo acordo vem sendo construído ao longo de 18 meses de negociação, e sua minuta já tem mais de 400 páginas. Bandeira de Mello disse que a repactuação não foi concluída porque, com a mudança de governo federal, vários ministérios e agências reguladoras ainda não se inteiraram das discussões.
“A prioridade é buscar devolver aos atingidos sua dignidade e seu modo de vida, que existiam antes do rompimento da Barragem de Fundão”, afirmou o conselheiro do CNJ. Segundo ele, também será necessário garantir recursos da repactuação para o saneamento básico da bacia do Rio Doce.
O advogado geral-adjunto da União, Júnior Fideles, reforçou o compromisso do governo federal de buscar a justa reparação e com a garantia da efetiva participação social. Para isso, o governo determinou que a Casa Civil comande a atuação federal, que contará com o trabalho de cerca de dez ministérios.
Fundação Renova emite posicionamento
A Fundação Renova informa que até janeiro de 2023 foram indenizadas mais de 410,8 mil pessoas, com pagamento de R$ 13,7 bilhões em indenizações e Auxílios Financeiros Emergenciais. O rio Doce demonstra níveis históricos de qualidade da água, que pode ser consumida pela população após tratamento convencional. Até o momento, das 560 famílias com imóveis afetados pelo rompimento da barragem de Fundão, 263 tiveram os seus casos resolvidos com a mudança para os seus novos imóveis ou indenizações. Nos novos distritos de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, 166 imóveis estão com as obras finalizadas, e as mudanças irão ocorrer gradativamente conforme a conclusão das casas e a manifestação da intenção das famílias. Até janeiro de 2023, R$ 28,42 bilhões foram destinados às ações de reparação e compensação do rompimento da barragem de Fundão.
Conteúdo atualizado em 29 de março às 9:33.
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