Dos mais de 12 mil servidores da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), quase 75% são mulheres. Elas ultrapassam a marca de 9 mil profissionais distribuídas por diversas áreas. São porteiras, recepcionistas, profissionais da enfermagem (auxiliares, técnicas e enfermeiras), médicas, auxiliares administrativas, jornalistas, administradoras, advogadas entre outras mais de cem ocupações.
Basta navegar rapidamente pelo site da instituição (Quem é quem) para perceber que, além de serem maioria, elas também ocupam grande parte (73%) dos principais cargos estratégicos da Fhemig, entre eles o de presidente da instituição.
Quase dois terços (63,04%) das servidoras têm nível superior. As demais cursaram o ensino médio (35,71%) e o fundamental (1,25%). A maior parte (63,74%) tem entre 29 e 49 anos de idade. Aquelas com 50 anos ou mais correspondem a um terço da força de trabalho. As muito jovens (18 a 28 anos) e as mais experientes (60 anos ou mais) respondem por 2,27% e 10,73%, respectivamente.
Mais de 8 mil dessas profissionais trabalham na fundação entre um e 20 anos. As restantes ultrapassaram os 20 anos de dedicação e algumas já completaram quatro décadas de serviços prestados à saúde pública. Quase metade (48,32%) é casada e pouco mais de 40% são solteiras.
Orgulho de fazer parte
Ao longo de sua trajetória, as mulheres acumularam diversas conquistas rumo à igualdade de direitos, principalmente no âmbito do trabalho. Apesar disso, ainda hoje, o Dia Internacional da Mulher continua relevante devido ao fato desses avanços não alcançarem a maioria delas. A data representa, entre outras coisas, uma oportunidade para a sociedade pensar e dialogar sobre a questão.
Segundo a presidente da Fhemig, Renata Dias, “as mulheres conquistaram e continuam conquistando cada vez mais espaços na Saúde e em outras áreas. A história da Fhemig, maior rede hospitalar pública do país, é marcada pelas conquistas alcançadas pelas servidoras que tanto se dedicam ao trabalho que realizam. Tenho orgulho desse time, que se esforça para oferecer a melhor assistência aos mineiros”.
Faz 32 anos que a auxiliar administrativa Ivanilda Cândida da Silva, de 54 anos, ingressou no serviço de Internação do Hospital Eduardo de Menezes (HEM), em Belo Horizonte, referência estadual em infectologia. Atuar na saúde pública não foi algo planejado. Segundo ela, a oportunidade surgiu e para alguém - como faz questão de frisar - que nasceu com a missão de “ajudar ao seu próximo, sem olhar a quem”, foi natural trabalhar em um ambiente dedicado ao cuidado com o outro.
A carreira no hospital permitiu a ela criar um casal de filhos. A mais velha seguiu o exemplo da mãe e se tornou técnica em enfermagem. “Sinto que o meu trabalho é reconhecido. Estar no mesmo setor há 32 anos significa que o que faço é valorizado. Caso contrário, a chefe já teria me colocado ‘para correr’. De vez em quando, a gente recebe um elogio”, reflete em tom de brincadeira.
Reconhecimento
A mesma sensação de reconhecimento é compartilhada pela enfermeira do Hospital Regional João Penido (HRJP), em Juiz de Fora, na Zona da Mata, Maria Cristina Coelho, de 65 anos - 35 deles dedicados ao trabalho no hospital. “O HRJP é uma instituição que me acolheu e na qual fiz um grande número de amigos”.
Inspirada pela irmã, que foi técnica em enfermagem e a apoiou a ingressar na carreira da saúde, ela acredita que os profissionais da enfermagem são a espinha dorsal do hospital, e não vê diferença na forma como mulheres e homens trabalham no dia a dia da assistência. Em sua avaliação, isso é um reflexo da luta empreendida pelas mulheres historicamente.
Também movida pelo orgulho de trabalhar na saúde pública, a cirurgiã do trauma Daniela Fóscolo conta que, no final de semana, ao participar da formatura de uma turma da cirurgia do trauma, ouviu de duas formandas que ela as inspirava e que era sua musa. “É engraçado ser musa de alguém. Isso mexe com o nosso imaginário. Em que momento deixamos de ser aquela cirurgiã sentada no balcão, que atende todo mundo que chega, e nos tornamos alguém que inspira outras pessoas, especialmente outras mulheres, em um mundo tão masculino quanto a cirurgia do trauma, quanto a urgência e a porta do pronto-socorro João XXIII especificamente?”, comenta.
Somos diferentes
Para Daniela Fóscolo, os 14 anos na linha de frente do Hospital João XXIII, um dos maiores prontos-socorros do país, foram responsáveis por um profundo aprendizado, uma mudança de perspectiva de vida e a certeza de que as mulheres têm uma forma diferenciada de exercer seus ofícios.
“A mulher, tanto na linha de frente quanto nos bastidores da saúde pública, sempre tem, de maneira geral, uma visão mais ampla. Vê além da sua ação direcionada, do que tem que fazer pontualmente. Vê mais porque está acostumada a pensar dessa maneira, está acostumada a lidar com mil coisas ao mesmo tempo. Nosso cérebro faz uma coisa ao mesmo tempo em que pensa em outra”, assegura a médica.
Ainda segundo Daniela Fóscolo, que também é gerente médica do Complexo de Urgência e Emergência da Fhemig, num passado recente, os cargos de gestão eram restritos ao público masculino. “Faço as coisas de uma maneira diferente e chego a um resultado semelhante ao obtido pelos homens”. A mulher se adapta melhor e é mais cobrada. A cobrança é interna também: “Tenho que ser boa o suficiente para estar nesse meio, tenho que ser igual’. E a gente não é igual, somos diferentes”.
Autocuidado
Acostumadas a cuidar dos outros, seja dos filhos, dos pais ou dos pacientes, as mulheres, nem sempre, dedicam igual atenção a si mesmas. “Talvez a maior dor de uma mulher seja entender que o lado profissional e o lado pessoal nunca irão se equilibrar. Sempre, em algum momento, um deles irá sair perdendo. Temos uma cobrança da sociedade de que devemos ser perfeitas em tudo”, desabafa a cirurgiã.
Ivanilda concorda com Daniela. “Minha jornada diária é bem puxada, trabalho em regime de plantão. Nas minhas folgas, dou aula de dança e faço aula de dança. Se aparece uma faxina, eu faço. Na verdade, quase não tenho tempo para dormir, mas é muito gratificante o que faço”, sublinha a auxiliar administrativa.
Mãe solteira de um filho adolescente e com pais idosos para cuidar, Daniela Fóscolo conta que trabalha em três locais. “Faço duas pós-graduações e tenho um animal de estimação. Se eu for pensar na minha carga horária semanal, próximo de 100% das horas estão ocupadas”.
A médica conta que, por um longo período, a mulher que ela é ficou escondida. “Eu era só mãe e só profissional. Nos últimos anos, tenho trabalhado arduamente para recuperar a mulher. Hoje faço um esforço danado para fazer ginástica e terapia. Tenho meus hobbies, adoro música, cantar e ler. Sou vaidosa e me cuido bastante. É o presente que me dou. Mas é dureza, quase precisa de um alarme no celular: acordar, se cuidar e depois viver a vida”, confidencia em meio a risadas.
Saúde da mulher
Com quase cinco décadas de atuação, a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais é a maior rede de hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS) e abrange diversas especialidades de serviços, distribuídos por 19 unidades assistenciais. Nesse universo, a saúde da mulher recebe atenção especializada em Belo Horizonte e no interior do estado.
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