Moradores relatam medo, insegurança e cobram soluções diante da ameaça de despejo que atinge 3 mil famílias.
A crise habitacional que afeta Mariana voltou ao centro das discussões na última segunda-feira (24), durante uma audiência pública realizada na quadra da Escola Municipal Monsenhor José Cota. Convocado pela Comissão de Habitação e Política Urbana da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), o encontro reuniu parlamentares, autoridades municipais, movimentos sociais, Ministério Público, Defensoria Pública e centenas de moradores das regiões da Cidade Alta, Rosário e São Gonçalo, áreas onde cerca de 3 mil famílias — mais de 11 mil pessoas — vivem sob ameaça de remoção.
O foco da audiência foi a insegurança provocada pelo processo nº 5000662-39.2019.8.13.0400, que trata da titularidade e ocupação das áreas e pode resultar em despejos sem que haja, até o momento, alternativas de reassentamento consideradas adequadas pelas famílias impactadas. A situação, apontaram especialistas, é resultado de um impasse histórico que remonta à década de 1930, quando grandes áreas foram transferidas à Mina de Passagem, mas nunca utilizadas conforme o plano industrial previsto. Hoje, a concentração fundiária é vista como um dos principais entraves à regularização urbana.
Outro fator que agravou o cenário, segundo moradores e movimentos de habitação, foi o rompimento da barragem de rejeitos de Fundão da empresa Samarco em 2015, que elevou os preços dos aluguéis e pressionou a ocupação de áreas mais vulneráveis. Durante a audiência, representantes das comunidades cobraram transparência sobre os R$ 30 milhões do PAC das Encostas, questionando quando os recursos serão aplicados e quais obras serão executadas para reduzir riscos.
Vozes das comunidades: medo, incerteza e resistência
As falas de moradores deram o tom mais emocional da noite, revelando a angústia de quem teme perder o único patrimônio que possui.
“A gente vive com o coração apertado. Não sabemos se amanhã alguém vai bater na nossa porta dizendo que temos que sair”, disse Maria das Dores, moradora da Cidade Alta há mais de 20 anos. “Eu criei meus filhos aqui. Não temos para onde ir.”
No Rosário, a situação também é de apreensão. “É muito fácil falar que é só remover, mas ninguém pensa onde vamos morar. Casa para alugar está cara demais. Temos medo de parar debaixo de uma lona”, afirmou José Carlos, marcando forte aplauso do público.
Moradores de São Gonçalo reforçaram que muitas famílias já enfrentam vulnerabilidade social. “Para muita gente daqui, perder a casa é perder tudo. É começar do zero sem ter nada”, destacou Luciana Ferreira, que também pediu agilidade nas políticas de regularização.
Propostas e cobranças
Entre as alternativas discutidas durante a audiência estavam: regularização fundiária das áreas ocupadas; revisão da destinação das terras vinculadas à Mina de Passagem; possibilidade de desapropriações para programas de urbanização; ampliação do aluguel social e criação de auxílios emergenciais; articulação entre Prefeitura, Governo de Minas e União para conduzir soluções coordenadas; fiscalização mais rígida dos termos judiciais em curso.
Representantes de movimentos de moradia defenderam que nenhuma decisão judicial seja executada sem garantia de reassentamento digno. Ministério Público e Defensoria reforçaram que a prioridade deve ser a proteção social das famílias e a transparência dos órgãos públicos.
Insegurança continua
Apesar do debate amplo, muitos moradores relataram que seguem apreensivos quanto ao futuro. “A audiência foi importante, mas a urgência continua. A gente precisa de respostas,” declarou Rivaldo Souza, morador do Rosário.
O encontro encerrou com o compromisso da ALMG de continuar acompanhando o caso, mas a sensação predominante entre os presentes foi a de que o risco de despejo permanece real e exige ação imediata.
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