Os valores calculados no acordo de repactuação brasileiro poderão ser adiantados a atingidos e prefeituras no processo inglês, movido pelo escritório Pogust Goodhead em Londres contra a BHP, caso vençam o julgamento de responsabilização pelo rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, na Região Central de Minas Gerais.
As alegações finais foram ouvidas na quinta-feira (13/03) na Royal Courts of Justice, em Londres, e uma sentença de culpa parcial, total ou absolvição será proferida em meados deste ano.
A BHP é acionada em Londres por ser inglesa e australiana. Ao lado da Vale, é sócia da Samarco, a mineradora que operava a barragem.
A afirmação sobre o adiantamento de indenizações em caso de condenação da BHP é do escritório Pogust Goodhead, que considera que esse valor já é reconhecido como devido pelas mineradoras, uma vez que o ofertaram no acordo de repactuação. A BHP, por outro lado, afirma que só em 2028 poderão ocorrer pagamentos.
No caso do município de Mariana, por exemplo, o acordo no Brasil previa R$ 1,2 bilhão, enquanto o processo na Inglaterra pleiteia, no mínimo, R$ 28 bilhões. Enquanto todo o recurso não for liberado, o escritório acionará a Corte inglesa para que os R$ 1,2 bilhões sejam adiantados.
"Mariana já aguardou por nove anos para uma justa e devida reparação. Mas nenhum prefeito participou ou foi ouvido no Brasil para formular a repactuação. Os valores ofertados seriam 4% do total e um pagamento em 20 anos. Por isso, acreditamos na vitória na Inglaterra e em ter pelo menos a indenização ofertada no Brasil de forma rápida", disse o prefeito do município, Juliano Duarte (PSB), que acompanhou o desfecho em Londres.
"É uma antecipação das indenizações. A lei inglesa (Código Civil - Regra 25) prevê receber uma parte antes do fim do cálculo, de 50% a 70% dos valores de forma antecipada. A tática da BHP tem sido atrasar e alongar ao máximo os prazos como forma de se esquivar das obrigações de pagamento", afirma o CEO e sóciofundador do escritório Pogust Goodhead, Tom Goodhead.
A próxima audiência em Londres está prevista para abril de 2025, quando a Justiça da Inglaterra ouvirá o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) para entender os motivos de o instituto ter ingressado com a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 1.178 no Supremo Tribunal Federal (STF).
O Ibram questiona a constitucionalidade de um município processar uma empresa em cortes do exterior, a seu ver, afrontando a soberania nacional. O instituto conseguiu uma liminar para que os honorários ao escritório inglês não sejam pagos.
Em caso de vitória dos atingidos, as audiências para comprovação de danos e cálculo de indenização total deverão ocorrer em outubro de 2026.
BHP
A BHP já informou que segue no caso em Londres sem sinalizar acordos. "Estamos confiantes com nossa defesa no Reino Unido e nas evidências apresentadas, as quais demonstram que segurança sempre foi prioridade para a BHP e que agimos com responsabilidade", informou a empresa.
"Continuaremos a nos defender no caso, respeitando o processo legal inglês. A BHP não está envolvida em nenhuma negociação de acordo em relação ao processo inglês e continua certa de que o trabalho em andamento no Brasil desde 2015 é o melhor caminho para garantir uma reparação completa e justa para as pessoas atingidas e para o meio ambiente", declarou a multinacional.
"Se o caso (julgamento na Inglaterra) continuar após a decisão sobre responsabilidade, a segunda fase do julgamento está programada para ocorrer entre outubro de 2026 e março de 2027. Em seguida, será necessária uma terceira etapa, ainda não agendada, na qual cada reclamante precisará provar seus danos individuais antes que qualquer pagamento seja feito, o que poderá ocorrer somente após 2028", informou a empresa.
A mineradora informa que, desde o primeiro dia, tem apoiado a Samarco na compensação e reparação para as pessoas e o meio ambiente atingidos pelo rompimento da barragem.
"Nos últimos nove anos, a Samarco e a Renova, apoiadas pela BHP Brasil e Vale, forneceram assistência financeira emergencial e pagaram indenizações a aproximadamente 432 mil pessoas, empresas locais e comunidades indígenas e tradicionais e está reparando meio ambiente, moradias e infraestrutura impactadas", disse.
Segundo a empresa, aproximadamente 200 mil requerentes no Reino Unido já receberam um total de R$ 9,5 bilhões por meio dos programas indenizatórios disponíveis no Brasil.
"Em outubro do ano passado, um novo e definitivo acordo de R$ 170 bilhões foi assinado com as autoridades brasileiras, o maior do gênero na história do Brasil. Mais de 70 mil pessoas já se inscreveram para um novo e definitivo sistema indenizatório conduzido pela Samarco no Brasil, sendo o caminho mais rápido e eficiente para o recebimento de indenizações", prossegue.
Barragem
O rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, ocorreu em 5 de novembro de 2015. A ruptura lançou 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro e lama na Bacia Hidrográfica do Rio Doce, entre Minas Gerais e o mar no Espírito Santo. Dezenove pessoas morreram, e mais de 700 mil foram atingidas.
"A BHP tentou se esquivar dizendo que foi a Samarco a responsável pelo rompimento. Que só era sócia e não operava a barragem. Todos os argumentos da BHP foram expostos como sendo uma falácia. Ouvimos provas e evidências da responsabilidade da BHP pelo rompimento ao longo de todo julgamento", afirma Tom Goodhead.
"O mundo deve entender o que essa companhia (BHP) fez. Obrigou centenas de milhares de vítimas a viajar metade do mundo para ter justiça. É um dos comportamentos corporativos mais terríveis já vistos por uma multinacional. Vai passar pela história como o pior escândalo corporativo do mundo. Foi muito impressionante ver a coragem e a resistência dos nossos clientes", afirma o CEO do escritório internacional.
"O rompimento da barragem de Fundão da Samarco em 2015 foi uma tragédia, e nossa solidariedade permanece com as famílias e comunidades atingidas", declarou a BHP.
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